Agricultura 4.0 e 5.0 no campo: desafios e oportunidades para quem vive da terra
Em meio às plantações de mandioca, milho, feijão e hortaliças, e ao som das ordenhas nas madrugadas, um novo tempo vem se anunciando no campo brasileiro: a era digital. Tecnologias como drones, sensores de solo, aplicativos de gestão, robôs e máquinas inteligentes começaram a transformar o modo de produzir alimentos. Essa revolução, conhecida como Agricultura 4.0 e 5.0, já é realidade em muitas grandes propriedades. Mas como ela chega — e como pode chegar de verdade — à agricultura familiar, que representa a maioria das propriedades rurais do Brasil?
Segundo o último Censo Agropecuário do IBGE, realizado em 2017, o Brasil possui cerca de 4,4 milhões de estabelecimentos agropecuários, sendo que mais de 3,9 milhões (cerca de 77%) são classificados como agricultura familiar. Esses agricultores produzem mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros, segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). Porém, apenas uma pequena parcela dessas famílias tem acesso a ferramentas tecnológicas avançadas.
A Agricultura 4.0, baseada em conectividade, Internet das Coisas (IoT), automação e uso de dados em tempo real, promete mais produtividade, economia de recursos e sustentabilidade. Já a Agricultura 5.0, que é considerada uma evolução dessa fase, busca ir além: aplica inteligência artificial, robótica e tecnologias preditivas com foco não só na produtividade, mas também na inclusão social, no cuidado ambiental e na adaptação climática.
Entretanto, a entrada da agricultura familiar nesse novo tempo enfrenta uma série de barreiras. A falta de acesso à internet de qualidade no campo ainda atinge mais da metade das propriedades brasileiras. De acordo com levantamento da Anatel de 2024, cerca de 55% das áreas rurais ainda não possuem conexão estável ou rápida o suficiente para o uso de tecnologias digitais de gestão agrícola.
Outro entrave é o custo elevado dos equipamentos e sistemas digitais. Máquinas com GPS embarcado, sensores climáticos, drones e softwares de gestão ainda são inacessíveis para boa parte dos pequenos produtores. Além disso, há o desafio da formação técnica e digital: muitos agricultores e agricultoras não têm familiaridade com essas novas ferramentas, o que exige ações de capacitação contínua e assistência técnica qualificada.
Há, no entanto, sinais de mudança. Universidades, cooperativas, organizações da sociedade civil e programas governamentais vêm desenvolvendo projetos voltados à inclusão digital da agricultura familiar. Algumas iniciativas investem em tecnologias sociais adaptadas à realidade do pequeno produtor, como sensores de baixo custo, aplicativos gratuitos e maquinário em escala compatível. Plataformas como a Grão Direto, por exemplo, possibilitam que agricultores vendam diretamente sua produção a compradores, eliminando intermediários e aumentando a renda. Já o programa Conecta Campo, do Ministério das Comunicações, atua para levar internet a áreas rurais isoladas.
Além disso, a nova política industrial do governo federal, chamada “Nova Indústria Brasil”, lançada em 2024, prevê incentivos para a mecanização e digitalização da agricultura familiar. A meta é aumentar de 18% para 70% o nível de mecanização das propriedades familiares brasileiras até 2033, com foco em inovação adaptada à realidade do campo.
Mesmo diante das dificuldades, agricultores e agricultoras familiares mostram disposição para se adaptar, desde que tenham apoio. A convivência entre o conhecimento tradicional — passado de pai para filho, enraizado no manejo do solo e das sementes — e as novas tecnologias pode ser um caminho fértil para o futuro do campo.
A digitalização da agricultura não precisa significar o apagamento da cultura camponesa. Pelo contrário: pode ser uma aliada na valorização da produção familiar, na redução da pobreza rural, no fortalecimento da segurança alimentar e na preservação ambiental.
Com planejamento, políticas públicas adequadas e investimento em conectividade, capacitação e inovação, é possível garantir que os benefícios da era digital cheguem a quem mais precisa: os milhões de brasileiros e brasileiras que vivem da terra, produzem alimentos com o suor do rosto e sonham com um futuro mais justo, produtivo e conectado.