A população de jumentos no Brasil caiu 94% em menos de 30 anos. Com o aumento dos abates para exportação, a espécie pode ser extinta até 2030, ameaçando a agricultura familiar e o equilíbrio no semiárido.
Entre 1996 e 2025, o Brasil assistiu a uma dramática redução de sua espécie asinina: dos 1,37 milhão de jumentos existentes, restam hoje pouco mais de 78 mil — o equivalente a apenas 6% da população original. Esse cenário avassalador, liderado por um declínio de 94%, sinaliza a urgência de medidas para evitar a completa extinção até 2030.
O responsável por esse colapso é, em grande parte, o crescente apetite da China pelo ejiao — uma gelatina medicinal feita a partir do colágeno da pele dos jumentos. A cada ano, milhões de animais são sacrificados para alimentar esse mercado bilionário, impactando não apenas o rebanho brasileiro, mas ameaçando ecossistemas e modos de vida tradicionais em todo o mundo.
No Brasil, o abate se concentra na Bahia, lar dos únicos frigoríficos autorizados para jumentos, que entre 2018 e 2024 exterminaram quase 250 mil indivíduos. A atividade, desprovida de uma cadeia sustentável, tem escassa fiscalização, expõe os animais a maus‑tratos, riscos sanitários e impõe prejuízos às economias locais.
Para a agropecuária familiar, especialmente no Nordeste, o jumento sempre foi muito mais que um animal de tração: é parceiro de trabalho, meio de transporte de água, lenha, alimentos, ferramentas e até de pessoas em comunidades onde o acesso a veículos motorizados ainda é limitado. Seu papel é essencial para o cotidiano de milhares de agricultores familiares, que dependem dessa força de trabalho adaptada ao semiárido — resistente ao calor, à escassez de alimento e à lida no campo.
A extinção do jumento compromete diretamente a resiliência da produção rural de base familiar, pois retira uma ferramenta de baixo custo, ecológica e adaptada, ainda vital para muitas comunidades ribeirinhas, quilombolas e sertanejas.
Em resposta, pesquisadores, organizações e governos se mobilizam. Em junho de 2025, um importante encontro em Maceió reuniu vozes nacionais e internacionais para lançar a campanha “Stop The Slaughter” e defender o fim do abate por meio de projetos de lei em andamento no Congresso Federal e na Assembleia da Bahia. Paralelamente, surgem soluções científicas — como o colágeno cultivado em laboratório — que prometem preservar a espécie sem comprometer a inovação.
A preservação do jumento não é apenas um ato de compaixão animal: trata‑se de proteger um patrimônio genético e cultural do campo brasileiro, apoiar a agropecuária familiar e reafirmar um modelo de desenvolvimento mais ético, sustentável e solidário com quem vive da terra.
O Brasil está diante de uma escolha: seguir um caminho extrativista e irreversível ou investir em políticas públicas, tecnologias e legislações eficazes para garantir a sobrevivência dessa espécie e a dignidade das famílias do campo que com ela caminham lado a lado há gerações.
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